Os cientistas desconhecem as respostas para as questões de pesquisas que formulam. Isso é óbvio, muitos poderiam dizer, com razão. De fato, quem segue o método científico sabe que não há essa possibilidade porque não se sabe o comportamento dos dados que, por sua vez, vão gerar as informações que, depois de serem conectadas, vão gerar as descobertas. Infelizmente há pessoas, que não são cientistas, é importante asseverar, que dizem que vão provar isso ou aquilo antes sequer de formular uma questão de pesquisa válida. E essas pessoas imaginam que estão fazendo ciência quando, na verdade, o que fazem é denúncias baseadas naquilo que eles imaginem ser a verdade, coisa que não existe na ciência. No caso específico dos estudos voltados para a geração de tecnologia, dois são os grandes fundamentos da adequada e válida organização dos dados. O primeiro é, naturalmente, que os conhecimentos gerados sejam confiáveis, de maneira que o comportamento da realidade que vai ser manuseado ocorra o mais próximo possível daquilo que está sendo explicado. O segundo é que essa precisão entre o explicado o que se passa efetivamente com a realidade é determinante para o sucesso da tecnologia porque impede novos estudos para consertar explicações desconformes.
O que um cientista voltado para a criação tecnológica deseja é a geração de determinado artefato que resolva determinado problema. E quanto mais rápido for a materialização da tecnologia, tanto melhor, uma vez que rapidez e precisão muitas vezes são duas coisas difíceis de se compatibilizar, configurando-se aquilo que os cientistas da engenharia chamam de trade off. A experiência tem mostrado que quando as questões de pesquisa, tanto a principal quanto as norteadoras, são devidamente formuladas e a coleta e organização dos dados seguem um protocolo em sintonia com elas, aumenta em muito a probabilidade de se ter os conhecimentos necessários para a construção do protótipo. Muitas vezes essas questões precisam ser elaboradas e respondidas em sequência, como foi o caso da produção das vacinas contra a covid19. Primeiro se buscou identificar o causador da enfermidade, depois os componentes do vírus, em seguida focou-se a dinâmica de atuação, prosseguiu-se com a explicação da ação dentro das células e assim por diante.
A concorrência entre os vários grupos de cientistas planetários fez com que a rapidez fosse alcançada a partir da meticulosidade e precisão aplicadas em cada etapa, em cada etapa da aquisição dos conhecimentos, das explicações acerca do vírus e sua dinâmica. Quando passaram a realizar estudos semitecnológicos, que são os que mesclam explicações de natureza teóricas seguidas de construção de artefatos para aferir a explicação gerada, fortaleceram-se ou retificaram-se as explicações essencialmente teórico-empírica. À medida que os conhecimentos foram ficando cada vez mais sólidos e robustos é que se passaram para as investigações de cunho tecnológico em suas diversas etapas. Isso continuará até que o imunizante esteja definitivamente pronto para o uso especificado para a população.
Queremos mostrar com essa digressão que é a organização dos dados que permite a aquisição de sentido sobre a realidade. A organização dos dados tem o ousado e singular desafio de encontrar ordem no caos. Esse caos é diretamente proporcional à quantidade de dados coletados. Dados de 50 casos são imensamente menos complexos do que um trilhão de registros. Mas tanto os de pequena quanto os de grande quantidade precisam cumprir a exigência de precisão e validade. É por isso, como veremos, que hoje se trabalha com as representações lógico-matemáticas em conjunto com outras, diagramáticas. Não basta apenas mostrar que os p-valores estão ou não além ou aquém da margem de erro máxima: é preciso mostrar visualmente essa constatação lógico-matemática. E isso é exigência não apenas para os chamados estudos baseados em números, mas fundamentalmente aqueles baseados em expressões orais e textuais.
O estágio final de todo esforço de organização de dados é sempre uma representação. Pode ser um diagrama esquemático, gráfico, tabela, quadro, equação, enfim, qualquer meio através do qual se possa visualizar a lógica que está por trás daqueles registros singelos que chamamos de dados. É por isso que as questões conceituais definicionais exigem figuras que mostrem os termos de equivalência e os atributos. Para as questões conceituais operacionais a exigência é a de uma equação matemática ou representação lógica com o intuito de evidenciar as dimensões e categorias analíticas do fenômeno sob estudo. Nesses dois casos, não importa se os dados são qualitativos ou quantitativos.
O segundo fundamento é decorrente justamente da precisão da exigência da representação como produto da organização dos dados: essas figuras já sinalizam a estrutura analítica da tecnologia (EAT). Quando digo que gestão é o processo de planejar, organizar, dirigir e controlar e represento essa descoberta como f(G) = proc (p + o + d + c), qualquer artefato que eu venha a criar precisa dar conta dessa representação. Para a tecnologia ser gerencial, portanto, precisa estar voltada ou permitir o planejamento, organização, direção e controle. É por essa razão que dizemos que o estágio final da organização dos dados é a captura de uma fotografia ou filme daquilo que se quer materializar.
O método científico-tecnológico é o primeiro voltado especificamente para a produção de tecnologias tendo como matéria-prima exclusiva o conhecimento científico. Há metodologias ativas de aprendizagens como a baseada em problemas, baseada em projetos, design thinking e inúmeras outras que também geram artefatos. Todas são absolutamente necessárias para diversos desafios e precisam ser conhecidas e manuseadas. Contudo, apenas o MC-T se fundamenta exclusivamente na precisão e validade científicas das explicações que leva em consideração para a criação de seus artefatos tecnológicos.
(*) Daniel Nascimento-e-Silva, PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)