Relatos, denúncias, pesquisas e troca de experiências resultaram em uma carta com recomendações ao Poder Público para o combate efetivo aos maus-tratos às gestantes nas unidades de saúde em Roraima. O documento, que está em redação final, foi discutido e aprovado durante o I Fórum de Combate à Violência Obstétrica.
A violência obstétrica é um tipo de violência contra a mulher, praticada por profissionais de saúde, caracterizada pelo desrespeito, abusos e maus-tratos durante a gestação e/ou no momento do parto, seja de forma psicológica ou física.
Esse tipo de violência causa na mulher a perda da autonomia sobre seu corpo e sexualidade. A violência obstétrica contribui para a manutenção dos altos índices de mortalidade materna e neonatal no país.
Entre as recomendações da carta, estão a realização de uma Audiência Pública na Assembleia Legislativa de Roraima, garantia de acesso a bancos de informações a comunidades científicas e instituições, fortalecimento das ouvidorias de Saúde Pública e do Comitê de Investigação de Morte Materna e óbito neonatal em Roraima, capacitação de servidores e realização permanente de campanhas educativas sobre os direitos da gestante.
O I Fórum de Combate à Violência Obstétrica foi coordenado pela Defensoria Especializada de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher e promovido em parceria com a Escola Superior da Defensoria Pública (Esdep) e com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). O evento ocorreu na sexta-feira (10).
A titular da Especializada da Mulher, defensora pública Terezinha Muniz, explica que a ideia do evento surgiu em fevereiro, a partir da divulgação de denúncias sobre o atendimento às gestantes na rede pública de saúde roraimense. Foram mais de 130 inscrições de profissionais da saúde, estudantes de Medicina e Enfermagem, sociedade civil e gestores.
“Isso nos enche de satisfação e orgulho. Estão de parabéns, não só a Defensoria Pública que pensou em realizar o Fórum, mas as organizações parceiras, que foram o Fundo de População das Nações Unidas e a Escola Superior da Defensoria Pública, além de todas as pessoas que participaram. Foi uma troca de conhecimentos e experiência incrível, que estimula todos nós a dar continuidade a esse debate que foi iniciado”, afirma a defensora.
Para Patricia Ludimila Melo, coordenadora de Prevenção e Resposta à Violência Baseada em Gênero (VBG), do UNFPA, a realização do Fórum foi um “divisor de águas”, pois oportunizou, além da união de pessoas que atuam na saúde obstétrica e sociedade civil para essa discussão, a produção da carta de recomendações.
“O Fórum cumpriu, sim, seu papel e já temos muitos encaminhamentos importantes. Foi o primeiro passo de grandes lutas que teremos que travar daqui em diante, mas saímos com o dever de casa, com essa carta de recomendação com mais de 18 propostas”, afirmou.
Participantes destacam importância do evento
Viviane Monteiro é estudante de Psicologia na Universidade Federal de Roraima (UFRR) e destacou os relatos e opiniões de profissionais da saúde sobre a questão como ponto alto do evento.
“Maravilhoso e muito importante. É muito necessária essa discussão fora das universidades. Como é um momento muito raro, esse de ter um evento falando sobre violência obstétrica, é de extrema importância para toda a sociedade”, salientou a universitária.
Acompanhada do filho ainda pequeno, Tainá Marinho relembrou a própria experiência no parto e elogiou a forma como o evento expôs a triste realidade que muitas mulheres vivenciam ao dar à luz.
“Eu mesma tive meu segundo filho no hospital, tive violência obstétrica com o maqueiro, com o pessoal da vacina, foi uma série de coisas acontecendo. A gente não esquece. Todo aniversário do meu filho, eu lembro de tudo que tive que impor para conseguir ter a hora dourada, que é ter a criança nos braços. […] A gente precisa trazer a faculdade, os conselhos, e sensibilizar mais e mais pessoas, fazer a legislação ser cumprida”, comentou Tainá.
A professora Atener Ambrósio, que também é membra da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMIAB), expôs a própria experiência e a da filha, que recentemente passou por um parto. Ela afirma que a situação não pode ser generalizada, mas precisa ser discutida.
“Não falo somente pelas minhas parentes indígenas, falo pelas negras, não indígenas, ribeirinhas. Que elas sejam bem atendidas, com atendimento adequado, humanizado, como mulher, como ser humano”, destacou.