Para debater o uso medicinal da cannabis e seu impacto na vida das pessoas que sofrem de doenças neurológicas e dores crônicas, a Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) promove a audiência pública “Cannabis Medicinal – Pela Garantia do Tratamento e Acesso de Medicamentos à Base de Canabidiol”, nesta quinta-feira, 1º, no Plenário Noêmia Bastos Amazonas, a partir das 9h.
Com transmissão ao vivo pela TV Assembleia (57.3), Rádio Assembleia FM (98,3) e redes sociais do Legislativo (@assembleiarr), o evento vai disponibilizar certificado de participação. O formulário de inscrição já está disponível no site do Parlamento (https://al.rr.leg.br/).
O debate reunirá parlamentares, órgãos públicos, estudantes, sociedade civil, profissionais de saúde, pacientes e demais interessados no assunto, a fim de buscar soluções e avanços na área de cannabis medicinal em Roraima.
A autora do requerimento para a audiência, deputada Catarina Guerra (União), destacou a importância da Casa Legislativa se envolver na discussão. Segundo ela, a iniciativa surgiu a partir do contato com famílias e pacientes que enfrentam dificuldades no acesso aos medicamentos.
“O que motivou a realização dessa audiência foi o impacto causado, no Brasil e no mundo, pelo uso desse medicamento na vida das pessoas. Fomos procurados por famílias envolvidas nessa situação. Precisamos ter esse diálogo com a população e inserir Roraima no caminho de garantir o tratamento e assim proporcionar melhoria e qualidade de vida para possíveis pacientes”, justificou.
Ainda de acordo com a parlamentar, há muitos pacientes, incluindo crianças e idosos, que, mesmo com indicação médica, precisam recorrer a medidas judiciais, tornando necessária a ampla divulgação de informações para desburocratizar o processo.
“Muitas vezes, infelizmente, as pessoas precisam recorrer às vias judiciais para conseguir esse tipo de medicamento. Por isso, precisamos destravar essas informações. Temos um projeto de lei em tramitação que busca garantir o acesso ao tratamento de forma gratuita pelo SUS [Sistema Único de Saúde], pois sabemos que, muitas vezes, idosos e crianças, mesmo autorizados, precisam buscar fora do Brasil esses remédios”, disse.
Segundo Catarina Guerra, o envolvimento dos roraimenses é essencial para enriquecer o debate e fornecer subsídios para futuras decisões e políticas públicas relacionadas ao uso medicinal da cannabis.
“Convidamos cada um de vocês para conhecer esses relatos que teremos nessa audiência, a partir das 9h, no nosso plenário. Precisamos dialogar e debater esse assunto, para buscar alternativas e garantir acima de tudo o acesso gratuito a esses medicamentos para a população do nosso Estado”, convocou a parlamentar.
Debate amplo
Para ampliar o debate e fornecer diferentes perspectivas, a audiência contará com a participação de especialistas de diversos segmentos. Na área médica, o psiquiatra Wilson Lessa, professor da Faculdade de Medicina da UFRR (Universidade Federal de Roraima), que possui diversos estudos sobre o tema e abordará os aspectos históricos do uso medicinal da cannabis, e o psicólogo e doutor em Psicologia, Calvino Camargo, que também é docente da UFRR.
Representantes da Justiça, Oleno Matos, defensor público-geral, Jeanne Xaud, defensora pública, e a advogada Sarah Mubarac, da OAB/RR (Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Roraima), vão tratar da atuação da Defensoria Pública e da OAB em relação aos tratamentos de saúde à base de canabidiol.
Além disso, serão ouvidos depoimentos de pessoas e/ou familiares que fazem uso medicinal, como Priscila Moraes, mãe de uma criança autista, Anêde Antonia Rodrigues, filha de uma pessoa com Alzheimer, e Hermes Lira Martins, responsável por uma criança com epilepsia, e de associações, a exemplo da presidente da União de Pais e Pessoas Autistas (UPPA), Muryanne Gianluppi, e Antônia Cristina Leite de Souza, representante de um grupo de pessoas com fibromialgia.
A academia marca presença com o Núcleo de Psicologia, Coordenação de Farmácia e Coordenação de Direito das Faculdades Cathedral, e as coordenações de Enfermagem e Medicina da UFRR.
Participam ainda representantes de órgãos públicos e conselhos de classe, como a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau), Secretaria Municipal de Saúde, Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR), Procuradoria-Geral do Estado (Proge), Conselho Estadual de Saúde (CES-RR), Conselho Regional de Medicina (CRM-RR) e o Conselho Regional de Psicologia (CRP-RR).
Canabidiol: saúde pública e controvérsias
O canabidiol (CBD) é um dos componentes encontrados na planta Cannabis sativa, popularmente conhecida como maconha. Nos últimos anos, o uso medicinal do CDB tem sido objeto de debates e controvérsias.
A principal razão pela qual a liberação do CBD é polêmica está relacionada ao fato de que a maconha é considerada uma substância ilícita devido ao alto teor de Tetrahidrocanabinol (THC), o principal elemento tóxico e psicoativo da planta. No entanto, o cânhamo (Cannabis sativa subespécie ruderalis), onde o CBD é encontrado, possui baixos níveis de THC, o que o torna muito visado para fins terapêuticos.
De acordo com a Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006), o cultivo, o comércio (configurado como tráfico) e o uso recreativo da planta são proibidos. Mas, apesar de criminalizar as condutas relacionadas, a lei admite expressamente, em seu artigo 2º, parágrafo único, a manipulação e cultivo para fins medicinais e científicos mediante licença prévia.
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) regulamentou o uso da substância em 2015, permitindo a importação de medicamentos à base de CBD para o tratamento de condições de saúde específicas, com prescrição médica. No final de 2019, a Anvisa aprovou o registro, fabricação e venda, em resposta às demandas de pacientes e familiares que buscavam terapias alternativas para doenças graves.
Muitas pessoas defendem o uso do CBD como uma opção terapêutica segura e eficaz para o tratamento de transtornos neurológicos, como Parkinson, Alzheimer, autismo e outros. Estudos científicos têm demonstrado que a substância pode ajudar a reduzir convulsões, controlar a dor, diminuir a ansiedade e melhorar a qualidade de vida dos pacientes, graças às suas propriedades analgésicas, anti-inflamatórias, ansiolíticas e anticonvulsivantes.
No entanto, junto com o crescente interesse, surgem críticas e preocupações. Alguns argumentam que a regulamentação atual é insuficiente e que o acesso ao medicamento ainda é limitado, burocrático e oneroso. Isso ocorre porque, apesar de existirem opções nacionais, muitas vezes é necessário importar o medicamento. Além disso, há questionamentos sobre a falta de pesquisas conclusivas sobre os efeitos a longo prazo e possíveis interações medicamentosas.
Em síntese, o uso do canabidiol é permitido para o tratamento de determinadas condições de saúde, mas a sua liberação é controversa devido à associação com a maconha, questões legais e de saúde pública. A discussão sobre a regulamentação e ampliação ao acesso continua em andamento, enquanto a ciência busca fornecer evidências sobre sua eficácia e segurança.
Suellen Gurgel