O MC-T se caracteriza por ser um método que produz conhecimentos científicos finalisticamente orientados para a produção tecnológica. Em termos analógicos e metafóricos, os cientistas que adotam esse método produzem ciência com os olhos voltados para a materialização de algum artefato tecnológico que, por sua vez, vai ser utilizado para a resolução de determinados problemas. Como mostrado até aqui, o ponto de partida é sempre uma demanda de indivíduos e/ou organizações, de forma que seu ponto de chegada é o suprimento dessa necessidade. Ao longo do caminho se fazem as produções científicas que vão nortear todas as etapas do processo de criação da tecnologia que vai garantir a solução desejada. É sob esse prisma que se devem buscar compreender tanto a produção científica (voltada para a prototipagem) quanto a produção tecnológica (assentada em conhecimentos científicos confiáveis). Isso não desmerece nenhuns outros procedimentos de geração de tecnologias, como o design thinking e as aprendizagens baseadas em projetos (PBL), por exemplo. Há apenas um diferencial entre o MC-T e todas as demais é que nosso método se baseia predominantemente na ciência.
É com a intenção de materialização de determinada solução que a etapa de organização dos dados da ciência e de fora da ciência precisa ser executada. Para o cumprimento das obrigações científicas, os dados literários dão lugar a marcos e arquiteturas teóricas, em primeiro lugar, e a novos conhecimentos, quando esses marcos e arquiteturas são testadas empiricamente. Esses resultados só são possíveis, contudo, quando submetidos a determinados procedimentos de organização dos dados. Afinal, os dados são os tijolos com os quais construímos o edifício da ciência e as edificações tecnológicas. É por essa razão que é necessário que se conheça o que é chamado de estrutura analítica do produto (EAP), primeira etapa do processo de prototipagem.
A engenharia de produção, e de forma mais detida a engenharia de produtos, tem elaborado inúmeros, sofisticados e precisos esquemas operacionais para a geração e aperfeiçoamento de produtos. Por exemplo, para o planejamento e controle da produção, uma das peças centrais é o que é chamado de Bill of Materials (BoM), que é uma lista de materiais um tanto quanto diferente. O fato inusitado é que ela não é apresenta em cada linha uma peça ou componente e seus detalhes, como fazemos com as listas do supermercado das compras periódicas. Ela é um desenho. Não um desenho qualquer, não é uma representação visual do produto futuro ou presente. Ela é uma espécie de organograma do produto. Vejamos isso mais de perto.
Imagine que se queira fazer uma EAP de uma carteira escolar. A primeira coisa é fazer um retângulo que representa a carteira. Embaixo desse primeiro e único retângulo devemos colocar os componentes da carteira, todos ligados ao retângulo de cima: assento, encosto, apoio e estrutura. Embaixo de cada componente, devemos repetir o procedimento, criando novos retângulos para cada subcomponente. No caso do encosto, por exemplo, deveríamos colocar “Peça de madeira”, “Revestimento plástico”, “Parafusos” etc., de maneira que se possa visualizar o componente e seus subcomponentes. O mesmo procedimento deve ser realizado até que todas as subpartes estejam devidamente visíveis. No final, teremos uma ideia mais ou menos precisa de a) como o protótipo pode ser construído, b) quais são os seus componentes, c) a quantidade de componentes e subcomponentes, d) a sequência do processo de montagem e d) o tempo para a geração de uma unidade.
Atualmente essa área de desenvolvimento de produtos está tão avançada que existem inúmeros softwares disponíveis para a criação de BoM e EAP. Quase todos os pacotes de Enterprise Resources Planning (ERP) apresentam pelo menos um módulo com esse intuito. Como são módulos de suporte ao planejamento e controle da produção interconectados aos outros inúmeros módulos organizacionais (recursos humanos, jurídico, marketing, governança etc.), ao mesmo tempo em que o processo de geração do protótipo inicia, uma teia comunicacional também começa a se formar. Por exemplo, se uma EAP utiliza determinado tipo de material, quando do registro no sistema de prototipagem essa informação é interligada com o estoque e módulos de armazenagem, que avisa se há ou não o material disponível. Se houver, a disponibilidade é vista pelos cientistas e, se necessário, reservada; se não estiver disponível e for necessária, a sugestão de aquisição aparece, assim como o tempo de suprimento.
O sucesso da construção de protótipos depende da representação visual da futura tecnologia e da lista de materiais que a materializará. É claro que muitas vezes os próprios materiais precisarão ser criados por inexistirem. Ainda assim, até nesses casos é necessário que todas as etapas de geração de tecnologias sejam executadas. Afinal, um novo material também é uma nova tecnologia. Mas a maioria das inovações não são tão revolucionárias assim, que exijam que a maioria de seus componentes sejam criadas pioneiramente. A prática tem mostrado que as revoluções tecnológicas são incrementais na sua maioria e que as mais inovadoras têm poucos componentes realmente novos. Quanto mais a ciência avança, mais o estoque de conhecimentos disponíveis acena com novos usos de materiais já consagrados.
A organização dos dados conceituais devidamente executada permite a construção de EAP com alta probabilidade de sucesso no estágio de prototipagem. O protótipo a que estamos nos referindo é à materialização do que o desenho, a representação diagramática, mostra. Uma EAP de uma carteira não é um protótipo, tampouco uma carteira em miniatura. Um protótipo é o produto que será submetido a testes. A diferença, portanto, entre um produto e um protótipo é que aquele já passou e foi aprovado em todos os testes a que foi submetido. Para que o protótipo aumente em muito as suas chances de se transformar em protótipo é que se criam as EAP.
(*) Daniel Nascimento-e-Silva, PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)