Coluna C & T: Redação da conclusão – Daniel Nascimento-e-Silva

Por mais incrível que possa parecer, é muito frequente encontrar manuscritos que pretendem a alcunha de científicos sem conclusão. Essa inexistência se dá de duas formas. A primeira é a ausência completa, ou seja, a inexistência de uma seção de conclusão. Essa forma é tão frequente quanto a segunda, que tem a seção de conclusão, mas o que está escrito ali não é conclusão. A primeira forma quase sempre é substituída por uma seção chamada Considerações Finais, mas em inúmeras outras vezes não há esse lugar nos manuscritos. Alguém pode até reclamar alegando o fato de que considerações finais é a mesma coisa que conclusão. Essa seção pode até cumprir essa função em manuscritos de outras naturezas, mas não na arena científica. A conclusão é o lugar onde se deve externalizar a resposta à pergunta de pesquisa ou hipótese principal do estudo. Considerações finais, por outro lado, é a necessária colocação de informações que não puderam ser colocadas no corpo do texto, mas que ajudam na compreensão dos seus resultados e que precisam ser considerados. É mais comuns nos manuscritos filosóficos, tanto que muitos deles têm, também, considerações iniciais, coisa que é inadmissível em ciência. Mas vejamos como se redige a conclusão de manuscritos científicos.

O ponto de partida é sempre a conclusão apresentada na discussão dos resultados, na seção anterior. A diferença é que ali a conclusão aparece de forma muito detalhada, como consequência lógica dos resultados parciais. Na redação da seção da conclusão, ela precisa ser sintetizada. E a forma mais recomendada de se fazer isso é em forma de resposta a uma pergunta de pesquisa ou como resultado de um teste de hipótese. Por exemplo, se a pergunta de pesquisa é “Qual é a relação entre o tamanho de uma organização e a intensidade de tecnologia que ela utiliza?”, a redação da conclusão precisa começar assim: “Este estudo mostrou que” e logo em seguida uma das possibilidades seria “há uma relação diretamente proporcional entre o tamanho da organização e a intensidade de tecnologia que ela utiliza”. Se o estudo pretendeu testar uma hipótese central, a conclusão deve começar assim “Este estudo mostrou que” e logo em seguida deve ser apresentado o resultado do teste, assim “o tamanho da organização influencia na intensidade de tecnologia utilizada por ela”.

Quando a redação da conclusão é feita dessa forma, é garantida a geometria entre a introdução e a conclusão, muito apontada por editores e revisores de revistas científicas de alto impacto. A lógica é simples. A introdução promete; a conclusão entrega. Na introdução é prometida alguma coisa em forma de objetivo geral; na conclusão essa promessa é cumprida. Na verdade, o cumprimento é feito na seção de resultados e discussão, mas é na conclusão que ela se torna explícita e sintética para que se possa compreender o caminho de volta, que completa a geometria. Para isso, depois que aquela primeira frase é escrita (“Este estudo mostrou que há uma relação inversamente proporcional entre o tamanho da organização e a intensidade da tecnologia que ela utiliza”), é preciso acentuar a importância dessa descoberta para que a comunidade científica se certifique da validade do seu desdobramento, quase sempre feito em forma de inferência. E essa inferência tem a amplitude exata dos dados sobre os quais a conclusão se assenta.

Resumindo: a redação da conclusão começa com a resposta à pergunta ou hipótese de pesquisa central e a importância de seu desdobramento. Depois disso a comunidade científica espera uma releitura da situação problemática que justificou a realização do estudo. Note bem: o que justifica a realização de um estudo científico não é a vontade do pesquisador, mas uma questão, uma pergunta, um problema, enfim. E esse problema é sempre de natureza teórica e/ou prática. Isso implica que o pesquisador percebeu um problema dessa natureza e se dispôs a dar alguma explicação que desse sentido àquela situação. É justamente isso que ele vai redigir no segundo parágrafo da conclusão, uma releitura daquela situação, só que, agora, levando em consideração a sua descoberta. Aqui ele vai mostrar, no caso do nosso exemplo inventado, que quando as organizações aumentam de tamanho precisam incorporar mais e mais tecnologias ou mais e mais mão de obra, que eram coisas que ele não sabia quando se propôs a entender a dinâmica da grandeza das organizações e a quantidade de tecnologias que elas usam.

A terceira parte da conclusão é mais inferencial ainda: o cientista precisa levar as consequências da sua descoberta para o campo teórico e/ou prático que o originou. O raciocínio é simples. Antes da sua descoberta, o campo teórico estava de um jeito tal que gerou a formulação de determinado problema; depois da descoberta, o panorama daquele campo teórico muda porque foi adicionado um conhecimento a ele. Essa terceira parte cumpre esse papel, de mostrar como a conclusão do estudo ajuda a compreender com mais adequação o contexto do campo teórico ou da aplicação ao qual os fenômenos estudados pertencem. Para ficar completa, a conclusão precisa apenas apontar as limitações do estudo e os novos meandros descobertos (novas dúvidas) e recomendar que novos estudos sejam feito com o intuito de ampliar o escopo explicativo das descobertas contidas no manuscrito que se pretende submeter a publicação.

Este artigo mostrou que há uma geometria na redação das conclusões de comunicações científicas que se consolida em quatro etapas. Ela começa com a apresentação sintética da descoberta, geralmente em duas linhas, e sua importância de seus desdobramentos. Em seguida, reapresenta-se a situação problemática, agora levando-se em consideração a descoberta do estudo. Depois é feita a recontextualização, que também é afetada pela descoberta e que é, de fato, a contribuição do estudo para a ciência. E tudo termina com a recomendação de estudos futuros, a partir das limitações dos resultados e dos novos meandros encontrados.

(*) Daniel Nascimento-e-Silva, PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

 

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