As figuras em suas diversas formas de apresentação ainda são um tanto quanto desconhecidas em seu papel nas redações científicas. O mais usual dessas inadequações é ver o uso das figuras como meras ilustrações, como em um esforço inconsciente de quebrar o visual dos textos. Exemplos comuns são o texto falar de poluição, colocarem-se fotos de poluição; falar de crianças abandonas, imagens de crianças são expostas; falar de evolução do PIB, um gráfico com essa evolução é mostrado. O problema é que essas figuras são apenas alocadas ali, de forma ilustrativa, mas sem nenhuma menção a elas.
Quando há alguma referência, elas são tão inócuas quanto não tê-las colocado, como traduz a frase “Vide figura X”. O que essa enormidade de textos desconhece é que toda figura, qualquer que seja ela, é uma fonte de evidência. As figuras traduzem os achados, parciais ou globais, da realidade. E uma fonte de evidência precisa ser explorada ao máximo. É preciso que cada figura ali alocada seja destrinchada, desdobrada, mostrado o seu sentido e interpretada à luz da teoria ou arquitetura teórica contida na seção de revisão da literatura. Quando se trata de criação tecnológica, as figuras se revestem de importâncias ainda maiores, porque preparam a documentação dos registros de autorias e patentes.
A primeira coisa que se deve entender sobre as figuras é que elas são fontes de evidência. O que isso significa? Significa que elas não podem estar ali por acaso. Elas precisam cumprir um papel fundamental que outros meios seriam incapazes de fazer. Elas trazem dados e informações tão grandes e em tão pouco espaço que sem elas seriam necessários inúmeros parágrafos para mostrar o que em um simples olhar se pode perceber. A segunda coisa é que, por esse motivo, há um esquema lógico que geralmente os cientistas utilizam para redigir textos com figuras. Na verdade, há dois esquemas lógicos. Um é relativo às figuras alocadas fora da seção de resultados, cuja função é sintetizar; o outro é relativo àquelas alocadas como fonte de evidência efetiva, na seção de resultados.
Quando as figuras aparecem na revisão da literatura elas têm a função de sintetizar teorias, marcos e arquiteturas teóricas. Pode-se alocar uma figura mostrando, por exemplo, as cinco fases da hierarquia das necessidades focando as especificidades do quadro teórico que se vai utilizar na investigação. Grandes cientistas não reproduzem figuras dos outros. Eles fazem alterações nas figuras porque essa alteração representa justamente o avanço que está sendo feito em relação ao escopo teórico que toda figura representa, quando alocada na revisão da literatura. Neste caso, dois parágrafos acima da figura explicam-se os meandros da teoria original e mostram-se os avanços (diferenças) que se está processando nela. Dois parágrafos abaixo da figura explicam-se os desdobramentos teóricos desse avanço. Sintetizando, dois parágrafos acima fala-se do conteúdo da figura; dois parágrafos abaixo, o que ela quer dizer, qual é o sentido delas.
Quando as figuras aparecem na metodologia, elas têm função exemplificativa. Elas exemplificam procedimentos utilizados. Nunca é demais reafirmar que o papel da metodologia é permitir que outros cientistas reproduzam nossas descobertas. E neste sentido as figuras cumprem um papel essencial, a começar pelo desenho do estudo, que geralmente é a primeira figura que obrigatoriamente deve constar nesta parte do texto. Outras figuras obrigatórias são os esquemas analíticos e os esquemas interpretativos. Os primeiros mostram como os dados foram quebrados, para descobrirem-se seus sentidos; os segundo mostram as estratégias de comparação das descobertas empíricas com as explicações teóricas. Novamente, acima das figuras redige-se o conteúdo delas; embaixo, como esse conteúdo foi usado.
De uma forma geral, as figuras podem ser completamente desnecessárias na revisão da literatura, quando o cientista tem muita habilidade redacional. Na metodologia, é uma exigência tácita que se coloque uma figura representativa do desenho do estudo. Mas onde elas são fundamental essenciais é na seção de resultados. Revistas de alto impacto exigem pelo menos uma figura enquanto evidência empírica para cada seção de resultado. E quando as descobertas parciais são robustas e ousadas, exigem-se várias figuras cujo intuito é não deixar pairar nenhuma dúvida sobre a realidade encontrada. Por essa razão, o mesmo esquema é utilizado: escrevem-se dois parágrafos acima mostrando o conteúdo de cada figura ou grupos de figuras e dois parágrafos abaixo explicando o que elas querem dizer, qual é o sentido encontrado nelas.
Por que os dois parágrafos acima e abaixo? Para cumprir a exigência científica de respostas a três perguntas: a) o que está acontecendo, b) como acontece e c) por que acontece. Os parágrafos acima mostram o que está acontecendo, enquanto os parágrafos abaixo mostram como acontece e por que acontece. Como isso caracteriza a ciência, o mesmo esquema é utilizado para a discussão dos resultados. Para isso, novamente, cria-se uma figura vinculando as descobertas umas às outras. Tomando-se como base a questão principal de pesquisa ou hipótese central, redige-se a parte de cima da figura mostrando o conteúdo da figura e na parte de baixo a comparação das descobertas com a arquitetura teórica. É daí que vem a conclusão.
As figuras não devem ser utilizadas nos documentos científicos para embelezá-los ou ilustrar o que está sendo tratado. Elas precisam cumprir um papel que outros meios seriam ineficazes para tal. Mas esse papel precisa ser redigido, mostrado, evidenciado, tanto em termos específicos, apontando-se determinado dado ou informação ali contida, quanto em termos gerais, em formato de generalizações, apontando-se sentidos. Noutras palavras, as figuras são fundamentais apenas quando dizemos ao leitor o que precisamos que ele veja, como entender isso que queremos que ele perceba e como isso está ligado a um esquema compreensivo maior, chamado teoria científica.