Coluna C & T: Protótipo de processos – Daniel Nascimento-e-Silva

Em termos gerais, três são as possibilidades de registros de patentes de inovações tecnológicas comumente divulgadas. A mais difundida é a patente de invenção, quase sempre sinônima de novidade, na criação de algo novo, que não existia antes do esforço humano de materialização. As vacinas para a covid19 são um exemplo típico dessa primeira possibilidade e que permeia a mente da maioria das pessoas. A segunda é representada pelos modelos de utilidade, que, de uma forma simplificada, são melhorias que se fazem naquilo que já existe, algo como aperfeiçoamentos, no todo ou em parte. Quando, por exemplo, um grupo de pesquisadores alteram a empunhadura de um equipamento, gerando mais comodidade e menos possibilidade de patologias ergonômicas, essa melhoria pode ser patenteável. E a terceira possibilidade são os desenhos industriais, que também de forma sintética representam a parte estética das invenções, sua beleza e todos os seus desdobramentos em forma de cores, dimensões, estruturas e tudo o mais. Contudo, tem um tipo de patente da qual quase não se fala, que são as relativas aos processos. Para que essas patentes possam ser adequadamente entendidas, vejamos o que são processos patenteáveis e quais são as principais etapas que comumente são utilizadas para se fazer esse tipo de protótipo.

Um processo pode ser definido como uma sequência lógica de tapas, com início, meio e fim previamente definidos que, ao final da execução da última dessas etapas, um produto (ou serviço) é materializado. Em primeiro lugar, processo são etapas. Uma etapa é todo estágio, passo, momento temporalmente definido, em que uma ou mais atividades necessariamente precisam ser executadas. Em segundo lugar, a ideia de sequência lógica representa a obrigatoriedade de uma etapa ter como exigência básica a sucessão de outra, também previamente definida, de maneira que B só poderá ser executada se A estiver concluída e se C for a sua sucedânea. Pode acontecer, contudo, que, depois de A, B e C devam ser executadas simultaneamente. De forma geral, portanto, sequência lógica é o disciplinamento da etapa ou etapas que necessariamente precisam ser executadas depois que outra for concluída. Em terceiro lugar, é preciso que sejam identificadas as etapas de início e a etapa final. Todas as demais serão consideradas etapas intermediárias, a não ser que o processo preveja um conjunto de etapas iniciais e outro conjunto de etapas finais, de forma que as demais serão tomadas como intermediárias. Em quarto lugar, todo processo precisa materializar algum produto, de forma que a sequência de etapas é a visão panorâmica e dinâmica de como, pouco a pouco, aquele produto final (as etapas geram produtos intermediários, tecnicamente chamados de WIP ou work in progress) é materializado. E em quinto e último lugar, o produto aparece feito e pronto quando a última etapa for executada. O processo de produção de medicamentos é feito assim, da mesma maneira que a obtenção de determinados princípios ativos e as sequências didáticas.

De posse desse entendimento, é fácil entender as etapas do processo de prototipagem de processos. Como acontece com a prototipagem de produtos, tudo começa com uma necessidade a ser suprida. Note que, em última instância, todo processo de inovação e geração de tecnologias tem como como foco o suprimento de alguma necessidade, que é uma maneira técnica de dizer “fazer o bem”. Não importa aqui se esse fazer o bem visa ou não ganhar dinheiro. Essa fase é conhecida como etapa pré-prototipagem e tem como finalidade e desafio conhecer os meandros, parâmetros, características e benefícios que o processo deve gerar. Essa etapa de conhecimento da demanda geralmente tem subetapas, que é definida pela equipe de pesquisadores em conjunto com os demandantes e outros stakeholders. Sob a ótica do método científico-tecnológico, vale a pena lembrar que a revisão da literatura é fundamental nessa e em todas as etapas subsequentes.

A segunda etapa é a esquematização do protótipo do processo. É feita de forma similar à prototipação do produto, com a diferença que, ao invés de uma estrutura analítica do produto, a finalidade aqui é definir todas as possibilidades de etapas do futuro processo. É como se fossem desenhados diversos processos distintos para levar à materialização do produto desejado. A terceira etapa é a escolha de quais dentre os processos gerados é o que mais é capaz de incorporar aqueles contornos, parâmetros, características e benefícios esperados do produto. É muito comum, aqui, que o processo escolhido tenha etapas originais substituídas por etapas de outros processos concorrentes.

A quarta etapa é a elaboração do primeiro protótipo do processo. Essa etapa consiste na sua representação gráfica, muitas vezes feita com o uso de fluxogramas ou diagramas multidimensionais, onde todas as etapas e subetapas possam ser vistas. A quinta etapa é o teste da eficiência, eficácia, efetividade, usabilidade e inúmeros outros, de maneira que se possa aferir a garantia de que o produto desejado será alcançado. A sexta etapa é a execução das alterações dos aspectos reprovados nos testes, que deverão ser feitas tantas vezes até que esses aspectos específicos estejam em conformidade com as exigências de demanda, identificadas na primeira etapa de prototipagem. A última etapa é sempre a apresentação do processo para o público-alvo, naturalmente com todas as especificidades necessárias, tais como registros obrigatórios em órgãos oficiais, esquematização de processos logísticos e informacionais, dentre inúmeros outros.

O processo de prototipagem de processos é muito similar ao processo de prototipagem de produtos. A diferença fundamental é que o produto final da prototipagem de produtos é sempre algo físico (como uma máquina) ou extrafísico (como programas de computadores), enquanto que os processos são representações esquemáticas de como fazer alguma coisa. Pode acontecer de se prototipar um produto novo e ao mesmo tempo prototipar o seu processo de produção com a finalidade de proteção por patente do produto e do seu processo de produção.

(*) Daniel Nascimento-e-Silva, PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

 

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