Direito garantido: após 56 anos juntos, casal de idosos oficializa união em projeto da DPE-RR

O ‘Enfim, Casados’, iniciativa da Defensoria Pública de Roraima, realiza sonho de casais que esperaram décadas pelo casamento civil, como José Sales, 76 anos, e Cícera Pereira, 73. – Foto: Taígo Araújo
Por Willians Dias e Taígo Araújo

O Brasil registrou, em 2023, mais de 940 mil casamentos civis, segundo dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Desse total, as uniões entre mulheres cresceram 4,9%, registrando diferentes configurações de famílias no país.

Em Roraima, o projeto ‘Enfim, Casados’, da Defensoria Pública do estado (DPE-RR), realiza casamentos coletivos gratuitos em diferentes municípios desde 2023, atendendo casais que enfrentavam dificuldades para oficializar a união.

Nos eventos, as cerimônias reúnem histórias de uniões recentes e de relacionamentos que atravessaram décadas. Na edição voltada a idosos, José Sales, 76, e Cícera Pereira, 73, aproveitaram para formalizar uma união de 56 anos. Para Cícera, o convite foi a chance de realizar um sonho antigo.

“A diretora falou que ia ter casamento para os idosos e perguntou quem queria casar. Eu disse que queria. Alguns acharam que já estávamos velhos demais, mas para casar não tem idade”, destacou. Ela classificou a data como inesquecível. “Foi a maior alegria que eu tive, um momento muito esperado na nossa vida”, comemorou.

Segundo José, a acolhida durante o evento foi marcante. “Fui muito bem recebido. Se pudesse, casava de novo”, afirmou. Ele acrescentou que há um momento certo para cada passo na vida. “Tudo tem o dia que Deus marca. Se há amor e boa vontade, vale a pena oficializar”, ressaltou.

Raiel e Amanda estão juntas há cinco anos. – Foto: Ascom DPE-RR

Amor em todas as formas

A edição ‘Toda Forma de Amor’, voltada à comunidade LGBTQIAPN+, ampliou o alcance do projeto. A supervisora de atendimento, Amanda Araújo, e a técnica em enfermagem, Raiel Homara, juntas há cinco anos, decidiram participar depois de conhecerem a iniciativa.

Conforme Raiel, o desejo de casar já existia, mas sempre havia impedimentos. “Já pensávamos em casar, mas nunca dava certo. Quando vimos no Instagram que teria o casamento coletivo, perguntei se era o momento e ela aceitou”, contou.

Segundo Homara, o formato voltado ao público LGBTQIAPN+ trouxe mais segurança e identificação. “Por ser voltado à nossa comunidade, nos sentimos mais confortáveis”, salientou.

O casal oficializou a união em cerimônia voltada ao público LGBTQIAPN+ – Foto: Ascom DPE-RR

Amanda relatou que o cuidado com os detalhes fez toda a diferença. “Desde o primeiro contato fomos acolhidas. A defensora cuidou até do buquê, tinha fotógrafos, música, transmissão ao vivo”, afirmou. Para a supervisora de atendimento, a oficialização trouxe garantias legais importantes. “Foi um dos dias mais importantes das nossas vidas, além de garantir nossos direitos como casal”, celebrou.

Em uma das edições mais recentes, realizada em parceria com a Igreja Evangélica Batista da Lagoinha de Boa Vista, 41 casais formalizaram a união civil e religiosa. De acordo com a professora Vanessa Alves, que está com o auxiliar de logística Paulo Sérgio desde 2020, o momento religioso representou um compromisso ainda maior que o civil, pois envolveu também a fé do casal.

“Casar no civil já é um compromisso sério, e no religioso foi ainda mais especial. Queríamos assumir publicamente a nossa escolha de sermos uma família cristã”, disse. Vanessa ressaltou que a participação no projeto tornou todo o processo mais simples. “A Defensoria cuidou de toda a parte burocrática e a igreja ofereceu o espaço e a cerimônia, o que tornou tudo mais acessível”, contou.

De acordo com Paulo, a organização da cerimônia foi determinante para tornar o dia memorável. “O evento foi pensado e organizado com muito carinho. Foi um momento único, de muita emoção e alegria”, afirmou.

O auxiliar de logística também observou que a parceria entre Defensoria e igreja uniu a formalização no cartório à celebração religiosa de forma harmoniosa. “Com o apoio da Defensoria e da igreja, foi possível unir a parte documental à cerimônia religiosa”, disse.

Vanessa Alves e Paulo Sérgio se casaram em cerimônia civil e religiosa. – Foto: Arquivo pessoal

Iniciativa em expansão

A defensora pública e coordenadora do projeto, Elceni Diogo, destacou a adesão da população. “As pessoas constantemente perguntam quando vai ter uma nova edição. Para 2025, elaboramos um calendário anual e resolvemos estruturar o projeto como temático, personalizando cada edição conforme o público que vai receber o casamento”, revelou.

Diogo também ressaltou que o ‘Enfim, Casados’ envolve mais que a formalização. “É muito mais que um casamento. É uma ação de cidadania que regulariza documentos, fortalece laços familiares, desburocratizando esse processo”, ressaltou.

Conforme o defensor público-geral de Roraima, Oleno Matos, o projeto tem como objetivo atender à necessidade de quem precisa. “Observamos uma grande demanda por legalização matrimonial. Então, surgiu a ideia do ‘Enfim, Casados’, e realizamos a primeira edição em parceria com a prefeitura e cartórios, unindo mais de 200 casais”, relembrou.

Matos destacou a evolução da iniciativa. “Aprimoramos o projeto para alcançar especialmente quem mais precisa. A Defensoria busca garantir direitos fundamentais à população vulnerável”, completou.

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