Durante o mês de dezembro, o prédio da Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) estará com iluminação especial em apoio à campanha “Dezembro Vermelho”, que mobiliza nacionalmente a população na luta contra o HIV/Aids e outras infecções sexualmente transmissíveis (IST).
No site da Casa Legislativa, há um banner de incentivo à realização de teste rápido. Instituída pela Lei 13.504/2017, a ação tem foco na prevenção e direitos das pessoas que vivem com HIV/Aids.
A campanha é recente, mas há mais de 25 anos a causa é alvo de preocupação do Legislativo roraimense. A primeira lei aprovada nesse sentido foi a 173/1997, que proíbe o sistema estadual de ensino a recusar matrícula de pessoas com HIV/Aids, de autoria do ex-deputado Jalser Renier. No ano seguinte, foi sancionada a Lei 200/1998, do ex-deputado Hélder Grossi, segundo a qual o governo deve fornecer, gratuitamente, medicamentos de última geração para o tratamento desses pacientes.
“A principal função do Poder Legislativo é defender os direitos da população, bem como amparar aquela parcela menos favorecida. É isso o que esta Casa de Leis vem fazendo ao longo desses mais de 30 anos de instituição: propondo e aprovando normas que visem à garantia dessas prerrogativas. O Dezembro Vermelho é uma importante campanha que tem nosso apoio, e esperamos apresentar e aprovar mais leis que beneficiem esse público”, reforçou o presidente da ALE-RR, Soldado Sampaio (Republicanos).
Também foram aprovadas outras normas de proteção, como a 483/2005, que dispõe sobre medidas de higiene e prevenção à Aids; a 562/2006, que trata da obrigatoriedade de veiculação de programas de informação e prevenção contra a síndrome aos alunos dos ensinos fundamental e médio.
As mais recentes a serem sancionadas foram a 1293/2018, que inclui as pessoas soropositivas no rol de isentos do pagamento de IPVA, e a 1.748/2022, que proíbe a discriminação de pessoas com HIV/Aids em órgãos e entidades da administração direta e indireta de Roraima.
Duplo preconceito
Francisco (nome fictício), de 42 anos, vive com HIV/Aids desde 2007. Filho de pai brasileiro e mãe venezuelana, mora em Roraima há 20 anos. Ele contraiu o vírus por meio do parceiro, que não sabia que estava infectado, após ter uma crise de asma e se submeter a alguns exames. Os dois ainda mantêm o relacionamento.
Para ele, conviver com o vírus não é fácil. Ele destaca que enfrenta uma dupla batalha contra o preconceito das pessoas: uma, em razão de ser soropositivo, e outra, por sua condição sexual. Ele conata que até já se deparou com discriminação de pessoas da área de saúde. Mesmo com tudo isso, Francisco conta que não se deixa abater. Além de trabalhar com costura, desde 2012 é voluntário na Associação de Bem com a Vida (AVB).
Lá, encontrou apoio, uma segunda família, e pode ajudar outras pessoas que, assim como ele, irão receber uma “mão amiga”.
“A ABV é um local que auxilia não só a mim, mas muitas pessoas. Eu vejo aqui uma grande família, porque, quando estamos sozinhos, é tão triste, principalmente quando você vem de outro país, é mais difícil. Me sinto tão acolhido que eu nem tenho como agradecer, a não ser dar o pouquinho do que eu sei para as pessoas que vêm de fora, porque não é fácil dar continuidade a um tratamento que é precário no meu país, pois você tem que pagar até U$$ 100 por uma medicação”, frisou.
Atualmente, ele não transmite mais o vírus, porém precisa continuar com os remédios para manter a qualidade de vida. “Não pare de tomar a medicação, porque se parar será uma porta aberta para a entrada de outros vírus oportunistas, que podem fazer com que você não saia de uma internação”, enfatizou.
Francisco também afirma que sempre incentivou o companheiro a realizar o tratamento correto – hoje, ele também não é mais detectável -, e que, primeiramente, aconselha as pessoas a se prevenirem 100%, mas, caso esteja infectado, se aceite e não abandone os procedimentos necessários.
“Cada passo que aprendi na ABV, eu repasso aos outros. Conheço pessoas que há sete, oito anos, não tomavam aos medicamentos e, agora, após o incentivo, me agradecem e relatam que estão bem, que estão vivas. É muito gratificante”, concluiu
Prevenção, diagnóstico e tratamento
A Aids é uma doença infecciosa causada pelo vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), e ainda não tem cura. Ele ataca o sistema imunológico, responsável pela defesa do organismo contra outras doenças, por esse motivo, se não tratado corretamente, pode ser fatal.
A médica infectologista Nayara Melo explica que o HIV tem “predileção” por algumas células de defesa, principalmente, os linfócitos – células presentes no sangue que atuam no sistema imunológico. Essas células são um meio de reprodução do vírus dentro do corpo humano. Após essa reprodução, para ele sair das células infectadas, precisa destruí-las.
“Existe uma destruição das células de defesa fazendo com que a imunidade caia. Essa imunidade caindo, a pessoa fica suscetível a pegar qualquer outro tipo de infecção e acaba que não tem defesas para combater, se tornando um ciclo que acaba gerando outras comorbidades e mortalidade”, explicou.
Uma das formas mais simples de evitar o contágio é o uso de preservativo nas relações sexuais. A infectologista também destaca a adoção da PrEP (Profilaxia Pré-Exposição), que consiste no uso diário de medicamentos para evitar infecções. Apesar de pouco divulgado, tem demonstrado eficácia na diminuição de casos em estados e países onde há amplo acesso a ele. No Brasil, é ofertado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) desde 2017.
“Em mais de 90% dos casos, ele evita a infecção por HIV, mesmo em relações sexuais desprotegidas. A pessoa que tem o vírus HIV, que o trata de forma correta, e que chega a ficar com sua carga viral indetectável, também não vai transmitir para outras pessoas. Essas são as duas principais formas de prevenção: a pessoa saber que tem, se tratar e conseguir alcançar essa carga viral, e para quem não tem, fazer o uso da medicação preventiva, porque ela é muito eficaz”, informou.
Entre os sintomas comuns, estão o surgimento de doenças infecciosas, como pneumonia, tuberculose, meningites e até o desenvolvimento de cânceres, como a leucemia. Todo o tratamento do HIV é disponibilizado pelo SUS, incluindo diagnóstico e consultas. Em Roraima, a assistência é feita pelas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) ou na Clínica Coronel Mota, centro de referência, que possui o Sistema de Assistência Especializada (SAE) no HIV.
Casos em Roraima
Conforme dados do governo federal, estima-se que há um milhão de pessoas com Aids no Brasil. Dessas, 650 mil são do sexo masculino e 350 mil são mulheres. Em Roraima, esse número chega a mais de 3 mil infectados. Vale lembrar que os dados são contabilizados a partir de pacientes que seguem o tratamento.
De acordo com a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau), em 2023 houve uma pequena redução no número de pessoas detectadas. Até o momento, foram 181 notificações em adultos, contra 191 casos em 2022.
“Os dados constam do Sistema de Informações de Agravos de Notificação e estão sujeitos à alteração”, informou. No entanto, o mesmo sistema apontou aumento dos registros de HIV. Foram 337 notificações em adultos e 299 no ano passado.
Suzanne Oliveira