Neste sábado, 24, é comemorado no Brasil o Dia da Conquista do Voto Feminino, que também consta no calendário oficial de eventos do Estado de Roraima, conforme a Lei nº 1323/2019, de autoria da deputada Aurelina Medeiros (Podemos), que propôs a norma com o intuito de orientar que na data sejam realizados eventos alusivos, como símbolo de conquista, cidadania e democracia.
Os primeiros vestígios da luta das mulheres pelo direito ao voto datam do século XVIII com a escritora Olympe de Gouges e a Declaração do Direito das Mulheres, que resultou na sua sentença de morte. No final do século XIX, na Inglaterra, dá-se início ao Movimento Sufragista, tendo à frente a educadora Millicent Fawcett. Mas foram a Nova Zelândia (1893) e a Finlândia (1906) que aprovaram o voto feminino.
No Brasil a história começa no fim do século XIX, mas foi no início do século XX que as mulheres, lideradas pela professora baiana Leolinda Daltro, fundou o Partido Republicano Feminino. Mais tarde, ela se uniu a Bertha Lutz, que criou a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, e em 1927, o Código Eleitoral do Rio Grande do Norte põe fim às distinções.
Mas somente em 24 de fevereiro de 1932, lembra a socióloga e cientista política, Geiza Pimentel, professora doutora da Universidade Federal de Roraima (UFRR), foi instituído o voto feminino no Brasil, mas ainda com restrições, pois só podiam votar as mulheres casadas com a autorização do marido ou as solteiras e viúvas que tivessem recursos próprios.
“Esse processo foi mais visível na Constituição de 1988, quando as mulheres puderam ter mais acesso a essa condição”, relembra, ao destacar que a abertura foi apenas de mão única, uma vez que ainda era tímida a participação das mulheres no pleito na condição de candidatas. A mudança ocorreu em 2009 com a Lei nº 12.034.
“Nós ainda temos poucas mulheres participando do pleito. São mais de cinco mil prefeituras em todo o Brasil e a representatividade em 2021, na última eleição para prefeitos e ex-vereadores, era de apenas 11% de municípios que são comandados por mulheres, o que é pouco dentro desse universo”, analisou.
O que se percebe é que, 92 anos após a instituição do voto feminino, a participação efetiva das mulheres ainda é pequena. “Das cinco mil prefeituras, apenas 658 são comandadas por mulheres no Brasil. Em termos de governo, só temos uma, no Rio Grande do Norte”, ressaltou.
A socióloga lembrou que a atual conjuntura política, de poucas mulheres com mandato eletivo, ainda é um reflexo do passado. Na opinião dela, isso é fruto da falta de apoio e de uma lei de cotas mais rigorosa que não exija apenas a participação de 30% das mulheres na política partidária, mas 30% de efetivamente eleitas.
“Tem muitas mulheres na política, mas ainda falta apoio. Há muitas dificuldades, principalmente na questão financeira e por exercerem várias funções ao mesmo tempo. Ao passo que os homens estão focados apenas na política. Avançamos, mas temos que pensar em mudanças na legislação federal”, disse Geiza, ao chamar a atenção para as candidaturas falsas e para a responsabilidade do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na fiscalização e punição dos que utilizam essa prática.
Para a juíza auxiliar da presidência do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RR), Graciete Sotto Mayor, os 30% destinados ao gênero feminino ainda não são uma realidade nas casas legislativas porque a mulher é responsável por várias atividades no cotidiano, e essa sobrecarga acaba impedindo que elas ocupem espaços que atualmente são ocupados por homens.
“Os dados da última eleição mostram que as mulheres eleitoras são a maioria no país. Em Roraima, elas dominam, com 52% do eleitorado. Somos a maioria, mas não temos todos os direitos no mesmo nível. A mudança legislativa em 2009 determinou que, pelo menos, 30% das candidatas sejam mulheres, mas isso ainda não se repetiu no Congresso Nacional, nas câmaras e nas assembleias estaduais. A dupla jornada das mulheres ainda impede uma maior participação”, ressaltou a juíza.
Mudanças podem reduzir participação das mulheres nos próximos pleitos, afirma advogado
O advogado Samuel Lopes, especialista em Direito Eleitoral, explicou que a cada eleição o voto feminino alcança mais visibilidade. Cada partido continua com a obrigatoriedade de reservar 30% das vagas para o público feminino, mas no próximo pleito haverá mudanças nas regras eleitorais com relação à participação das mulheres.
“Nesse pleito específico, tem duas mudanças significativas que vão causar polêmica. A primeira é a questão do somatório, que deixa de ser por legenda e passa a ser por federação. Na prática, isso diminuirá a participação de mulheres, porque não será mais por legenda do partido, passando a ser um somatório geral”, explicou Lopes.
Ainda segundo Lopes, a outra mudança também é significativa, e deve causar mais polêmica. “Trata-se do fundo partidário, que anteriormente era vinculado à participação de mulheres, cuja despesas deveriam ser para a campanha delas, com o objetivo de incentivar as candidaturas femininas. Agora, com essa nova regra, esse fundo pode ser flexibilizado e os valores podem ser investidos em despesas de campanhas masculinas, por exemplo”, detalhou.
Lopes disse não ter dúvida de que a alteração na legislação trará um prejuízo para as mulheres. Mas ele também faz um contraponto ao dizer que a própria conjuntura política e social, que ampliou a participação das mulheres, motivará novas candidaturas.
“Vejo que isso vai ser polêmico porque um valor que era para a campanha feminina, deixa de ser vinculado. As mulheres hoje ocupam espaços de relevância e todo partido quer a participação feminina. São elas que decidem as eleições, as que mais se manifestam, que vestem a camisa e compram as pautas sociais, afinal, elas são a maioria”, enfatizou.
Marilena Freitas