Coluna C & T: Organização de dados conceituais – Daniel Nascimento-e-Silva

Para que se faça a devida organização dos dados conceituais é necessário ter em consideração dois entendimentos sobre esse tipo de dados. O primeiro está vinculado àqueles coletados da literatura e que têm duas finalidades. A primeira finalidade é a compreensão da extensão e profundidade do fenômeno, que chamamos de definição conceitual; a segunda é relativa aos componentes que constituem tal fenômeno, que denominamos definição operacional. A junção dessas duas definições dá origem à chamada arquitetura teórica. Por essa razão toda organização de dados conceituais sempre deve resultar em um desenho, uma representação, figura, equação, enfim, um diagrama que permita a visualização daquilo que foi construído a partir do conhecimento que a ciência disponibiliza. O segundo entendimento é direcionado à tecnologia, de maneira que um conceito é uma imagem mental (que depois é colocada no papel) daquilo que se pretende materializar. Também é dividido em conceito do produto, em forma de desenho ou maquete, por exemplo, da tecnologia, e conceito executivo ou operacional, que mostra o funcionamento e seus componentes. É isso que precisa ser esclarecido, para que se possa executar com adequação a organização de dados em conformidade com as sugestões do método científico-tecnológico.

O MC-T tem como matéria-prima o conhecimento científico. Como consequência, seu primeiro desafio é sempre a realização de um balanço do que a ciência tem como conhecimento disponível até aquele exato instante em que se iniciaram os esforços de construção de alguma tecnologia. Esse balanço precisa gerar como resultado um diagrama que permita visualizar aquilo que a ciência sabe e as lacunas que precisam ser preenchidas para que se possa elaborar os protótipos com o máximo de segurança possível. Assim, os levantamentos da literatura precisam dar conta de duas representações. A primeira representação busca conhecer os limites de cada fenômeno envolvido na tecnologia. E a maneira como isso é feito é a partir de uma questão que começa com “O que é”. Quando pergunto “O que é radiofrequência?” estou querendo saber, de fato, até onde vai a extensão do conceito, o que ele abrange. Quando descubro que “radiofrequência é uma forma de energia eletromagnética que causa agitação no tecido molecular”, sei que sua extensão é o campo eletromagnético e que sua profundidade está vinculada a esse campo e aos corpos moleculares. Se desejo criar uma tecnologia com esse fenômeno, preciso saber como agir sobre esse campo e esses corpos – ou uma parte deles de forma específica.

Conhecida a dimensão conceitual do fenômeno, é obrigatório que se conheça pelo menos as suas partes ou seu processo. É que a maioria dos fenômenos é estudada a partir de seus componentes, de seu movimento ou de ambos. Portanto, conhecer o interior do fenômeno é fundamental para que se possa tanto representá-lo (essência da ciência) quanto em reproduzi-lo (essência da tecnologia). Assim, à dimensão conceitual segue a dimensão operacional que, como o nome sugere, precisa permitir operar o conhecimento que a ciência disponibiliza, junto com aquele que não existe e que precisa ser construído. Conhecendo as partes podemos elaborar uma estrutura analítica ou um fluxograma do processo do fenômeno. A partir deles é possível fazer um esquema de seu funcionamento, relacionamentos internos e relacionamentos externos. O diagrama resultante da dimensão conceitual mais uma ou mais das outras dimensões (estrutural, processual, relacional, funcional e ambiental) é chamado de arquitetura teórica.

Note que a finalidade do MC-T é originariamente a produção de tecnologia. Por essa razão, a coleta dos dados da literatura precisam gerar as representações que, em seguida, serão utilizadas para a realização da prototipagem e nos devidos testes-retestes fundamentais para a sua transformação em produto final ou tecnologia, uma vez que um protótipo é sempre um produção em elaboração, um WIP (work in progress). O levantamento de dados em bases tecnológicas, de registros de produtos e marcas, por exemplo, também tem que gerar um diagrama a partir dos diagramas ali disponíveis. Isso também é feito em duas etapas. A primeira precisa gerar o conceito da tecnologia, que é uma representação imagética mais a devida delimitação utilitária. A segunda é o detalhamento do funcionamento da tecnologia a partir da identificação de todos os seus componentes, chamada de conceito executivo ou operacional da tecnologia. Nessa organização, os diagramas da nossa tecnologia precisam permitir todas as diferenciações das demais existentes, para que fiquem evidenciadas quaisquer possibilidades de fraudes e imitações.

Esses dois aspectos da organização dos dados e seus produtos precisam ficar bem claros porque eles serão fundamentais para a preparação dos documentos exigidos para os devidos registros da tecnologia a ser gerada nos órgãos oficiais. De forma semelhante, muitas vezes os conhecimentos utilizados na geração tecnológica precisam ser validados pela comunidade científica antes que possam ser encapsulados em uma tecnologia e submetidos a testes, como é o caso dos fármacos e todo produto que possa, de alguma forma, causar danos aos seres humanos e outros seres vivos. O devido tratamento dos dados, portanto, é refletido no seu produto final, que é sempre um diagrama que, como será mostrado, precisa também ser válido para representá-lo.

O MC-T prevê duas origens de dados. Uma é de naturezas técnica, tecnológica e científica, disponíveis nos repositórios e bancos de dados; outra é de natureza empírica, coletados pelos próprios cientistas ou por outros, que ainda não foram consolidados em produto ou produção textual. A organização desses dados deve ser feita de forma tal que garantam tanto a precisão na retratação da realidade quanto o seu manuseio para fazer a prototipagem. Sem o balanço do conhecimento científico disponível não há prototipagem segura.

(*) Daniel Nascimento-e-Silva, PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

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