Coluna C & T: Redação de artigos científicos – Daniel Nascimento-e-Silva

Os artigos científicos são um tipo de comunicação se caracterizam por apresentarem uma parte onde é detalhado como cada resultado foi gerado. Essa parte é inexistente em todos os demais tipos de textos, principalmente os ensaios teóricos e literários. E isso é relativamente simples de ser compreendido. Os ensaios teóricos são uma forma de balanço estruturado da literatura, enquanto os ensaios literários são meios através dos quais os cientistas esclarecem determinadas questões científicas importantes ou apresentam determinados aspectos metodológicos ou teóricos sob uma perspectiva diferente. Ensaios, como o próprio nome indica, são ensaios, não são ciência. Dessa forma, a única forma de comunicação que é considerada científica é o artigo científico. Isso coloca de fora, por exemplo, as próprias dissertações e teses enquanto tais. Contudo, é costumeiro que essas produções acadêmicas sejam sintetizadas e suas descobertas apresentadas às comunidades científicas para validações, quando, só então, passam a ser consideradas conhecimentos científicos. Disso resulta que, sem a aprovação daquelas comunidades a quem os conhecimentos gerados afetam, não há ciência propriamente dita, uma vez que são os membros dessas comunidades que chancelam as descobertas como científicas ou não. Vejamos, agora, como são recomendadas suas redações.

O balanço da literatura é a primeira parte a ser redigida. É isso mesmo. Ainda que haja um projeto de pesquisa, com o problema, objetivos, justificativas e tudo o mais, a redação definitiva da comunicação científica começa com a estruturação textual do estado da arte. Aqui três coisas são centrais. A primeira é o escopo conceitual, que denota os limites do conhecimento sobre cada fenômeno estudado; a segunda são as dimensões analíticas, que representam as partes maiores de cada fenômeno; e a terceira são as categorias analíticas, que são as variáveis mensuráveis da realidade, cujos agrupamentos formam as dimensões analíticas. Isso significa, portanto, que as dimensões analíticas são constructos, são grupos inventados pelos cientistas arbitrariamente para efeitos compreensíveis e para facilitar os testes empíricos. É a partir das dimensões e categorias analíticas que são construídos os instrumentos de coleta de dados. Ainda que o balanço já esteja contido no projeto de pesquisa, ele precisa ser atualizado depois que os testes empíricos estejam concluídos.

A segunda parte a ser redigida são os resultados. Pode até parecer esquisito, mas é isso mesmo. Os resultados nada mais são do que as respostas obtidas para cada questão norteadora elaborada. E cada questão norteadora é a estratégia escolhida para alcançar cada objetivo específico. Por esse motivo, a seção de resultados precisa ter como tópicos os objetivos específicos. Por exemplo, se um objetivo específico fosse “Medir a correlação entre tempo de estudo e desempenho nas provas”, correspondente à questão norteadora “Tempo de estudo e desempenho nas provas estão correlacionados?”, o nome do tópico ou seção dos resultados seria “Tempo de estudo e desempenho nas provas”. A redação é feita sempre descrevendo-se o conteúdo da(s) figura(s) sintetizadora(s) do resultado do teste empírico acima dela e, embaixo, a interpretação, que é dizer o que aquele conteúdo quer dizer. Isso será detalhado mais à frente. A redação dos resultados termina com a comparação entre o que os achados empíricos querem dizer com a arquitetura teórica redigida em primeiro lugar.

Logo em seguida escreve-se a seção de metodologia. Note que é preciso que os resultados estejam prontos e redigidos para que se possa detalhar como cada um deles foi gerado. A metodologia tem que ser redigida sempre com a missão de fazer com que o estudo possa ser reproduzido por outros cientistas a partir do detalhamento feito nessa seção. Quando essa parte é feita meticulosamente, descrevem-se as questões norteadoras, desenho do estudo, população e amostra ou sujeitos do estudo, detalhamento dos instrumentos de coleta de dados (como foram construídos, testados e validados), estratégia de coleta, análise e organização dos dados, técnicas utilizadas para gerar e interpretar os resultados e limitações do estudo. Cada parte dessa precisa ser exemplificada, ou seja, é preciso demonstrar com figuras, gráficos, esquemas e outras formas representativas.

A conclusão é a parte que é redigida logo após a metodologia. Novamente, aqui parece uma esquisitice, mas é fácil de entender. A recomendação de se redigir a metodologia imediatamente após os resultados é apenas cronológica porque, de fato, cientistas experimentados redigem simultaneamente resultados e metodologia. A conclusão é o estágio final da comparação dos resultados empíricos com a arquitetura teórica elaborada. Isso quer dizer que, na prática, a discussão dos resultados é uma forma de detalhamento da conclusão do estudo. É por essa razão que a seção de conclusão (que é obrigatória) deve começar com a síntese dessa discussão e que corresponde à resposta sintética da pergunta de pesquisa ou hipótese global do estudo. A frase mais comum de começo de redação de conclusão é “Este estudo mostrou que…”, adicionando-se a conclusão sintética para completar a oração. Em seguida, explica-se a importância dessa descoberta para a ciência. O parágrafo seguinte refaz a situação problemática do estudo a partir dessa descoberta e, o posterior, faz o mesmo com o contexto teórico.

O texto termina com a redação da introdução. Essa parte começa com a apresentação do contexto teórico do estudo, prossegue com a clarificação da situação problemática que foi enfocada pelo estudo e termina com a apresentação do objetivo a ser alcançado. Note que a introdução é a parte contrária da conclusão. A introdução apresenta uma situação anterior à realização da pesquisa; a conclusão é posterior, e por isso faz uma releitura da situação anterior a partir da descoberta do estudo.

(*) Daniel Nascimento-e-Silva, PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

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